Livio Oricchio

Será que Massa não teve mesmo nenhuma responsabilidade?

Livio Oricchio

20/VII/14

Hockenheim, Alemanha

Felipe Massa não gostou quando lhe perguntei, neste domingo, por volta das 18h30 aqui de Hockenheim, portanto três horas depois da corrida ter acabado, se ''todo azar'' que diz ter é obra do acaso.

''Por quê? Você acha que eu tive culpa no que aconteceu hoje? Eu tive culpa em Silverstone? Eu tive culpa na Austrália?''Foi a resposta do piloto da Williams-Mercedes.

Gostaria de fazer algumas considerações em relação ao que aconteceu hoje na largada. Será que o acidente foi tudo mesmo obra do acaso, ou da ''minha falta de sorte'', como afirma Massa?

Como este espaço é eminentemente opinativo, afirmo: ''Não!'' Penso que ele tem sua parcela de responsabilidade no abandono do GP da Alemanha. E não pequena.

Explico: Kevin Magnussen tem este ano, o de estreia na Fórmula 1, um histórico de agressividade extrema na primeira volta. Na Austrália, abertura do campeonato, cruzou a pista da direita para a esquerda e da esquerda para a direita, como se estivesse na Fórmula 3. Fernando Alonso reclamou e disse que por muito pouco não foi atingido.

No GP seguinte, Malásia, Magnussen tocou em Kimi Raikkonen, destruindo o aerofólio dianteiro da McLaren e furando o pneu da Ferrari do finlandês. Na China, também na primeira volta, a vítima foi de novo Raikkonen, rompendo o aerofólio dianteiro da Ferrari. Depois disso, pressionado pela equipe para amansar na primeira volta, continuou agressivo, mas não se envolveu em acidentes.

Em Hockenheim, disputou excelente classificação, sábado, por ser talentoso, e obteve ótimo quarto tempo. Está pressionado, como o companheiro, Jenson Button, por ninguém menos de Ron Dennis, sócio da equipe, para obter melhores resultados. Seu futuro está em jogo.

Unindo as duas coisas, a sua agressividade na primeira volta ao fato de tentar aproveitar a excelente condição oferecida pela segunda fila no grid, era mesmo de se esperar que Magnussen não arrefecesse um instante sequer em Hockenheim. Dividir a curva com ele significaria elevadíssimas possibilidades de acidente.

Um piloto que estude o comportamento dos concorrentes próximos no grid, para ter uma ideia de como os primeiros metros da prova poderão se desenvolver, levaria em conta, com certeza, essa questão. Tente ver o que faz Alonso enquanto os carros estão no grid.

Ele vai lá na frente, vê onde tem mais borracha, esfrega o pé, procura se alimentar do máximo possível de informações para estudar a melhor trajetória inicial, sempre muito importante na F1, mesmo com maiores possibilidades de se ultrapassar, como hoje, com o flap móvel (DRS) e pneus em estágios distintos de desgaste.

Há mais. Tenho comigo que Massa, talvez até inconscientemente, não desejava por nada perder a terceira colocação, ter um carro mais lento que a Williams na sua frente, no caso a McLaren de Magnussen, por causa de querer a todo custo terminar a prova na frente do companheiro, Valtteri Bottas.

Se Magnussen ficasse entre ambos, Bottas abriria segundos preciosos para Massa, aumentando as chances de receber a bandeirada na sua frente. Por mais que Massa diga que não o está incomodando perder a disputa para Bottas, mas apenas se sentindo mais estimulado, não há como não pensarmos que, na realidade, se sente bastante desconfortável.

Massa foi contratado para ser o líder que a Williams precisava depois da pior temporada de sua história, no ano passado. Sua experiência de já ter vencido corridas e disputado o título na F1 cairiam como uma luva para o momento de reconstrução da Williams. E verdadeiramente o piloto tem sido muito útil, como Bottas e o diretor de operações, Rob Smedley, de forma regular sinalizam.

Então, como o piloto que recebe bom salário, bem mais que o novato Bottas, pelo menos três vezes, cujo potencial era desconhecido até então, pode ficar tão para trás? Consciente do ótimo carro que tinha nas mãos em Hockenheim, os planos de Massa eram de tentar, de alguma forma, esquecer Silverstone e mostrar que, como Bottas, também pode chegar ao pódio. Não esqueceu o caminho das pedras.

Se Magnussen está pressionado, Massa também está. Mas não por Frank Williams, como o dinamarquês por Ron Dennis, mas Massa está pressionado por ele próprio, o que é muito pior.

Vi e revi aqui na sala de imprensa do autódromo, de onde escrevo, a largada. A roda traseira direita da Williams de Massa passa sobre a roda dianteira esquerda da McLaren de Magnussen. Foi isso que catapultou o carro de Massa. A McLaren, portanto, não estava atrás da Williams. A frente da McLaren já estava na metade do carro da Williams.

E mais: não faz parte das atribuições de um piloto olhar no espelho antes de tomar a curva em tangência, a trajetória ideal, sendo a primeira do traçado, depois da largada, e tão próxima de onde os carros estavam no grid?

No quadro a quadro vê-se que a roda traseira direita de Massa toca no meio da lateral da McLaren. Ok, se Magnussen desejasse mesmo evitar um acidente, às custas de renunciar a possibilidade de sair em terceiro lugar depois da primeira curva, de fato poderia tirar o pé do acelerador e evitar colocar-se naquela posição, já potencialmente perigosa.

Penso, porém, que o dinamarquês acreditou que Massa não fecharia para dentro como fez, contornaria a curva 1 numa trajetória mais externa e ali haveria, então, espaço para ele. O piloto da McLaren deve ter se surpreendido com a súbita guinada da Williams para dentro da curva.

Assim como Magnussen, Massa podia também ter reduzido as chances do choque, desde que não escolhesse a trajetória ideal da curva, já que era a primeira e segundos, apenas, depois da largada, onde se sabe, com certeza, há sempre muitos adversários por ali com os mesmos interesses.

Esse quadro deixa claro para mim que nem tudo é obra do acaso nos incidentes de Massa este ano. Em Silverstone, de fato não teve responsabilidade no choque com Raikkonen, Massa foi até hábil em evitar algo mais sério. Como não teve culpa na Austrália, atingido por trás por Kobayashi na freada da primeira curva também depois da largada.

Mas, em Hockenheim, se havia alguém que poderia ter se exposto a possibilidades bem menores de aniquilar mais uma chance de um bom resultado, de extrema importância para si, era Massa. Não Magnussen.